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Jurisprudência

Como decisões judiciais podem impactar a igualdade de gênero na política? Confira nossos principais achados até aqui!
Ilustrações: Karynne Senna (@thekarynne)
Ilustrações: Karynne Senna (@thekarynne)

Nossa pesquisa quantitativa, baseada em jurimetria1, analisa processos judiciais protocolados em 2020 sobre dois temas: candidaturas fictícias2e violência política contra as mulheres.

A equipe utilizou dados extraídos da coletânea de jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), utilizando técnicas de raspagem de dados3 e análise descritiva e de texto, examinando tanto as ementas quanto as decisões.

Decisões

Dos processos analisados, a maioria (70,69%) foi decidida de forma monocrática4, enquanto 29,30% foram acórdãos5 Apenas um processo foi resolvido por resolução (0,01%).

Em termos de teor das decisões:

  • 75,85% foram consideradas improcedentes.
  • 22,82% procedentes.
  • 1,33% parciais.

Decisões colegiadas

Entre os acórdãos, 95,75% foram decididos por unanimidade, enquanto 4,25% foram por maioria


A análise de gênero revelou que a presença feminina na corte é mínima, com apenas 11% das relatoras sendo mulheres. Em 89 anos de Justiça Eleitoral, apenas oito mulheres integraram o Plenário do TSE.

  • Os principais relatores dos processos de 2020 foram:
  • Sergio Silveira Banhos (16,09%)
  • Alexandre de Moraes (13,06%)
  • Mauro Campbell Marques (10,22%)
  • Edson Fachin (10,10%)
  • Benedito Gonçalves (8,94%)

Achados

Gastos eleitorais e financiamento de campanha

Foram identificados 1305 processos sobre contas de campanha, com 60% decisões monocráticas e 83% classificadas como improcedentes.

O termo “candidata” apareceu em 305 processos, com 83% decisões monocráticas e 79% procedentes.

Violência Política de Gênero

– Não foram encontradas menções ao termo “violência política de gênero” nos processos referentes às eleições de 2020,  mas já estavam presentes expressões difusas como “ameaças”,  “disseminação de informação falsa”,  “propaganda abusiva”. Isso talvez se deva ao fato de que a  Lei 14.192/20216 seja do ano seguinte às eleições de 2020 e, por isso, o termo “violência política de gênero” –  evidenciado por tal Lei – ainda fosse pouco usual em nossos processos jurídicos. 

– Das candidatas que denunciaram violência política de gênero, pouco mais da metade (54%) são candidatas à prefeitura.

– Pouco mais de 80% se autodeclaram brancas.

– 90% dos relatores dos processos de violência política eram homens.

– Das candidatas que denunciaram violência política de gênero, todas possuíam Ensino Médio ou Superior completo, sendo que 55% possuíam Superior completo.

Fraude à Cota de Gênero

Foram identificados 505 processos sobre fraude à cota de gênero, com 46,73% decisões por acórdão e 53,27% monocráticas.

A maioria das decisões foram unânimes (97%) e 10% não tinham mulheres entre os julgadores.

– Centro-Oeste, Nordeste e Norte são os estados com maior número de processos por candidatura fictícia.

Caso Paradigmático8:

Recurso Especial (REsp) 19392/2020 (Valença do Piauí)

O caso envolveu o uso de candidaturas femininas fictícias nas eleições municipais de 2016 em Valença do Piauí (PI) e estabeleceu definições importantes sobre as decisões referentes à questão.

A partir deste caso, foram encontrados 60 processos relacionados, com 18 julgados procedentes. 

O TSE reverteu, a partir desta ocorrência, decisões em instâncias inferiores em 18 casos, anulando-as ou alterando-as. Na prática, aplicou-se uma interpretação mais punitiva contra candidaturas fictícias.

Então, em resumo, é isso…

  • A maioria das decisões foi tomada por um único juiz, e muitas delas foram consideradas improcedentes (sem fundamento). 
  • Baixa representatividade feminina entre relatores7 e julgadores.
  • Os processos por fraude à cota de gênero revelaram que, no país, é comum a existência de “candidaturas fictícias”, levando o TSE a agir de forma punitiva. O caso do município de Valença do Piauí foi emblemático nesses casos.
  • Em 2020, não houve muitas menções específicas à “violência política de gênero”, embora existissem processos sobre o tema. Isso mostra que a formalização de uma Lei sobre essa forma de violência, no ano seguinte, em 2021, foi muito importante. Só assim, o combate a esse tipo de violência contra as mulheres, que ainda não estava, em 2020, suficientemente incorporado nos processos eleitorais, tenderá a ganhar força.
  1. Aplicação de modelos estatísticos para a compreensão de processos e fatos jurídicos.
  2. Candidaturas de fachada que são usadas, geralmente, como artimanhas para desviar dinheiro do Fundo Eleitoral. Popularmente, também são conhecidas como “candidaturas laranjas”, significando que candidatas ou candidatos participam do processo eleitoral, mas sem a verdadeira intenção ou possibilidade de se eleger. Como as candidaturas fictícias afetam as mulheres na política? O TSE prevê, na Lei das Eleições, que os partidos preencham, dentre os filiados, a cota mínima de 30% de mulheres. Dessa forma, eles devem reservar pelo menos 30% dos recursos do Fundo Eleitoral para financiar as campanhas femininas. Porém, muitas candidaturas femininas são fictícias. Na prática, não há possibilidade ou intenção real de que essas mulheres se elejam; elas apenas garantem que o partido esteja dentro da Lei, servindo para garantir o repasse dos recursos, que beneficiarão candidatos homens.
  3. Web scraping ou raspagem de dados é uma forma de coleta de informações de sites da web, convertendo-os em bases de dados que possam ser analisadas posteriormente.
  4. Decisão proferida por um único magistrado.
  5. Decisões proferidas por pelo menos 3 magistrados, também chamadas de decisões colegiadas.
  6. Esta Lei estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher.
  7. O(a) juiz(a) ou o(a) desembargador(a) responsável por estudar um caso e elaborar um relatório com sua opinião sobre a decisão que deve ser tomada.
  8. Uma decisão judicial que estabelece um padrão para a resolução de casos semelhantes.